Digitalização de Arquivos Sonoros: uma questão de acesso
Responsáveis pelo projeto que trouxe para o formato digital cerca de duas mil músicas, o pesquisador Bruno Tavares, o técnico de áudio Philippe Ingrand e o produtor Paulo Cesar Soares debatem a importância da iniciativa
Em pauta, a digitalização de arquivos sonoros. Graças a ela, o Brasil Memória das Artes compartilha com internautas gravações preciosas de Nara Leão, Nana Caymmi, Moreira da Silva, Djavan, Cartola e tantos outros participantes de iniciativas da Funarte, como o Projeto Pixinguinha. Realizado entre 2005 e 2006, o projeto Digitalização de Arquivos Sonoros, viabilizado pelo projeto Brasil Memória das Artes, foi tema de uma conversa realizada no estúdio do Portal das Artes, com o pesquisador Bruno Tavares, o operador de som Philippe Ingrand (ambos responsáveis pela digitalização) e o produtor cultural Paulo Cesar Soares, coordenador do projeto à época. A mediação foi do jornalista Gustavo Autran.
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Entre espetáculos do Projeto Pixinguinha, das Bienais de Música Contemporânea e das Salas Funarte (Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília), são cerca de duas mil músicas digitalizadas, segundo Paulo Cesar Soares. Na Funarte desde os anos 70, o produtor cultural destaca o papel do então coordenador do Projeto Pixinguinha, o “visionário” Hermínio Bello de Carvalho, que já em 1977 determinou que toda a produção musical da recém-criada Funarte fosse registrada para a posteridade. “O futuro um dia chegou e está colocando tudo isso de volta.”
Para adequar o acervo sonoro às novas mídias, a dupla formada por Bruno Tavares e Philippe Ingrand, o Doudou, precisou mergulhar no passado da Funarte para, aos poucos, ir transformando gravações analógicas em digitais. “A digitalização é transferir essa informação para um suporte muito leve, prático e que pode mandar uma música para o mundo inteiro”, conta Philippe. “O acervo, até agora, ficava em uma sala.”
Tal ponto de vista é o mesmo de Bruno Tavares: “O fundamental do projeto de digitalização é dar acesso ao acervo sonoro”, define o pesquisador, ressaltando a importância da presença da Funarte na internet para fazer as gravações históricas chegarem a ouvintes do Brasil e do exterior. “O Portal das Artes e o Brasil Memória das Artes são projetos que estão na vanguarda brasileira da relação com memória e com acervos.”
Somente entre 1977 e 1989 – ano da primeira interrupção do Projeto Pixinguinha – são cerca 4 mil canções divididas em 240 shows. Entre 93 e 97, contudo, quando se deu a primeira retomada, não foram encontrados registros sonoros. Segundo Bruno Tavares, os que existem “na base de dados da Funarte foram doados pelo trabalho de sonorização que o Philippe fez na época. Como técnico de áudio, ele sempre teve o hábito de fazer esses registros.”
Já Philippe destaca a importância do operador de áudio Frank Justo Acker, “um personagem fantástico do Rio de Janeiro”, responsável por tornar possível a orientação de Hermínio Bello de Carvalho, de registrar para a posteridade todos os espetáculos do Projeto Pixinguinha. “Ali temos a visão aliada à competência. Porque o que o Frank fez nesses registros foram obras de arte. Ele grava com excelência.”
Outra contribuição preciosa de Frank se deu de forma material, nos anos 90, quando doou à Funarte um conjunto de 120 fitas de rolo que guardava em casa, como cópias de segurança dos registros de áudio do Projeto Pixinguinha. “Ele sabia que os assuntos se perdem, as presidências mudam e as portas mudam de chave”, confidencia Philippe, que acompanhava Frank no dia da doação, quando ouviu a recomendação de seu mestre à Funarte: “Que isto seja devolvido ao povo brasileiro, verdadeiro dono deste material.”