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Damas do samba no Projeto Pixinguinha: Dona Ivone, Leci Brandão e Gisa Nogueira

Trio de compositoras ligadas às escolas de samba mais tradicionais do Rio de Janeiro foi um dos destaques da temporada de 1980

Gisa Nogueira, Dona Ivone Lara e Leci Brandão: compositoras de samba no Projeto Pixinguinha de 1980

Gisa Nogueira, Dona Ivone Lara e Leci Brandão: compositoras de samba no Projeto Pixinguinha de 1980

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Em 1980, o samba ainda estava longe de ser território livre do machismo. Apesar de tantas boas cantoras, quituteiras e pastoras, no ofício de compor as mulheres eram (como ainda são, 30 anos depois) franca minoria. Pois foi a partir deste seleto grupo de compositoras que se pensou um dos espetáculos mais bem-sucedidos do Projeto Pixinguinha naquela temporada de 1980. Do Rio de Janeiro a Blumenau (SC), passando por São João de Meriti (RJ), Uberlândia (MG), Campinas (SP), São Bernardo do Campo (SP), Londrina (PR) e Florianópolis, não houve plateia indiferente aos belos sambas de Dona Ivone Lara, Leci Brandão e Gisa Nogueira. Ouça a íntegra do espetáculo na galeria de áudios ao lado.

Sambas que, além atestarem o talento do terno de damas, representavam uma parte importante da tradição musical carioca, como salientou o Diário do Povo, de Campinas, na edição de 18 de junho de 1980: “De repente, três escolas de samba do Rio de Janeiro entraram no palco do Teatro Interno do Centro de Convivência: a Império Serrano, a Mangueira e a Portela”, escreveu o jornal campineiro na resenha sobre o espetáculo da véspera. Sob o título “Projeto Pixinguinha trouxe samba do bom”, o texto elogiava as vozes e o repertório – de 32 músicas – das cantoras. Clique na galeria de imagens para ler matérias sobre o espetáculo.

Do trio, só a portelense Gisa – carioca do Méier, três LPs lançados e irmã do cantor e compositor João Nogueira – estreava no Projeto Pixinguinha. A mangueirense Leci Brandão, que naquele ano lançava seu quinto LP (Essa Tal Criatura), já tinha feito turnê com o bandolinista Joel Nascimento, em 1979. E a imperiana Ivone, com muitos anos de estrada e apenas dois LPs lançados, foi atração do Pixinguinha em 1978, ao lado do cantor Roberto Ribeiro.

Outro diário de Campinas que abordou o Projeto Pixinguinha na edição de 18 de junho foi o Jornal de Hoje, no qual se lia que o frio da cidade “golpeou a garganta de Gisa Nogueira”, que teve que desfalcar a estreia da caravana na cidade, em 16 de junho. Assim, sem a “cara nova no cenário do samba urbano carioca”, o crítico José Augusto Lemos escreve que “a bola sobrou (um tanto quadrada, diga-se de passagem) nos pés de Leci Brandão”, que, apesar da “voz potente” e da “boa presença de palco”, não conseguiu esquentar o público. Este, segundo Lemos, só se animou mesmo diante da “desenvoltura sanguínea e exuberante de Ivone Lara”.

Como nas outras cidades, o espetáculo terminou com o público campineiro fazendo coro para a veterana sambista no refrão de Sonho Meu, que, lançada por Gal Costa e Maria Bethânia em 1978, já era sucesso nacional na época da turnê. Considerado posteriormente um dos hinos da anistia, o samba teve sua história contada por Dona Ivone numa entrevista publicada pelo jornal O Estado, de Blumenau, em 29 de junho de 1980: “A música foi feita para meu marido, que tinha morrido pouco tempo antes e, como eu estava com saudades dele, fiz este lamento com Délcio Carvalho. Meu marido era uma criatura muito boa e com ele tive dois maravilhosos filhos que me dão muito orgulho. Sonho Meu não tem nada de anistia, não. Nada disso. Mas fiquei muito contente quando fui ao Pará e a rapaziada cantou pra mim. Cheguei a chorar.”

Já o Jornal de Domingo (Campinas), na edição de 8 de junho de 1980, publicou entrevista em que Leci Brandão deixava claro que não tinha medo de se posicionar em discussões polêmicas. Sobre racismo, por exemplo, se dizia incomodada com os negros que deixam de frequentar lugares ditos chiques com medo de sofrerem preconceito: “As pessoas deixam de fazer um negócio porque são negras. Eu não. Faço porque sou negra. Vejo minha cor em positivo”, disse a sambista. “Sei que existe racismo, mas não esquento.”

Mais adiante, Leci tratava de relatar o machismo que precisou enfrentar quando ingressou na ala de compositores da Mangueira, no começo dos anos 70, e foi derrotada na disputa de samba-enredo. “Eu era praticamente nova na Ala e o pessoal não admitia que uma garota pudesse ganhar. E não ganhei. Não deixaram. Mas não vou me acomodar nem na condição feminista, nem vou jogar charme pra nego tocar a minha música. Sou batalhadora”, definiu a cantora e compositora, afilhada musical do jornalista, pesquisador e produtor Sérgio Cabral.

Coube a Sérgio, aliás, assinar a direção artística do espetáculo e escrever o texto de apresentação do programa impresso, no qual dizia que as três cantoras são, para ele, “o que as ‘três mulheres do sabonete Araxá’ foram para o poeta Manuel Bandeira: elas ‘me invocam, me bouleversam, me hipnotizam’”. Com 23 apresentações realizadas em 27 dias de turnê (de 5 de junho a 2 de julho de 1980), o espetáculo contou também com os músicos Almir Moura (bateria), Carlinhos Queiroz (violão), Clarice Kamliot (piano), Marquinho (cavaquinho), Mendes (percussão) e Zé Maurício (contrabaixo).

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