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A histórias do Projeto Pixinguinha segundo seus participantes no período da retomada, entre 2004 e 2007

Atração de 2005, Lia de Itamaracá comandou uma animada ciranda em pleno palco. Crédito: Augusto Pinheiro

Atração de 2005, Lia de Itamaracá comandou uma animada ciranda em pleno palco. Crédito: Augusto Pinheiro

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As sessenta caravanas que circularam pelo país com as atrações do Projeto Pixinguinha, entre 2004 e 2007, renderam não só encontros inesquecíveis nos palcos ─ mas também saborosas histórias longe dos holofotes. É que o tempo passado na estrada, nos ensaios e nos hoteis ajudou a estreitar o convívio entre artistas de diferentes estados, e permitiu uma aproximação muito maior dos músicos com o público das cidades incluídas no itinerário. Quem teve a oportunidade de vivenciar a experiência voltou cheio de boas memórias. Muitos aproveitaram o tempo livre nas excursões para passear por pontos turísticos, conhecer de perto o público local ou mesmo compor novas canções. E, dependendo do grau de afinidade do elenco, poderiam surgir até novas parcerias musicais.

Por onde passaram, as caravanas mereceram ampla cobertura dos meios de comunicação e causaram forte rebuliço entre os fãs. Mas fora das grandes capitais, onde a oferta de shows é consideravelmente menor, a comoção dos espectadores foi ainda mais evidente. Um bom exemplo ocorreu após o show que o grupo caipira Viola Quebrada, do Paraná, fez com o cantor e violonista Passoca e o violeiro Roberto Corrêa num ginásio do Sesc em Porto Velho, capital de Rondônia, em 2005. “Na saída, uma moça me pediu emocionada para que nunca deixássemos de incluir a sua cidade na programação do Pixinguinha. Ela reclamava da carência de teatros na região e que ninguém ia se apresentar lá por causa da distância e dos preços das passagens”, conta Pedro Paulo Malta, que acompanhou muitos desses comboios musicais quando era Coordenador de Música Popular do Centro de Música da Funarte.

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Outra surpresa aconteceu no ano seguinte em Rio Branco, capital do Acre, durante a performance das compositoras Sueli Costa, Suely Mesquita e do cantor cearense Sergio Barros, radicado em Boa Vista (RR). A apresentação foi numa antiga usina de castanhas, bem afastada do Centro, quase no meio da floresta Amazônica. “Quando a equipe chegou ao local para passar o som, ficamos na maior dúvida se iria funcionar o show ali. Mas as pessoas foram chegando e o espaço lotou. Foi incrível. A própria Sueli Costa ficou de olhos arregalados ao piano, admirada com todo aquele pessoal cantando junto suas rebuscadas composições”, lembra Pedro Paulo.

Cantora e compositora, que no início da carreira foi “louraça belzebu” de Fausto Fawcett, no espetáculo Básico Instinto, Kátia B integrou uma caravana pop-contemporânea em 2006 − na companhia dos compositores gaúchos Vitor Ramil e Flu, ex-integrante da banda de rock Defalla. “Participar do Pixinguinha foi muito importante para o desenvolvimento do meu trabalho, até porque naquele momento eu tinha viajado mais para fora do Brasil, em turnês por países da Europa, do que para cidades do Nordeste. Houve uma química muito grande entre nós e pudemos perceber o amadurecimento do espetáculo ao longo da turnê. No quinto show já estávamos delirando com o resultado”, diz a cantora.

Conhecida pelo repertório que mistura elementos da bossa nova, do trip hop, e o uso de sampler (equipamento eletrônico que armazena e reproduz sons), Kátia registrou informalmente alguns momentos da caravana em sua câmera digital e ainda arrumou tempo para compor nos intervalos das apresentações. “Eu comecei a esboçar o meu terceiro disco, Espacial, durante a caravana. Tem música que compus inteira na estrada, é o caso de Vou Te Esquecer. Já a faixa Canto da Alegria, feita em homenagem a meu filho Vicente, eu comecei a fazer na viagem, mas terminei no Rio”, lembra. Clique ao lado para ouvir trechos da entrevista de Katia B.

Um dos personagens mais assíduos das caravanas do Pixinguinha, o cantor Zé Renato excursionou duas vezes no período da pós-retomada − em 2004, com Mario Adnet (violão e voz), Nonato Luiz (violão) e Virgínia Rosa (voz), e em 2007, ao lado da cantora Mariana Leporace e com o acompanhamento de um septeto. “Depois de reativado, o projeto ganhou uma configuração diferente, pois ficávamos um período menor nas cidades, entre dois e três dias. Eu já tinha uma história escrita com o Boca Livre, mas mesmo assim sabia que algumas pessoas tinham uma visão rasa da minha trajetória e o Pixinguinha permitiu um aprofundamento”, defende o cantor. Clique ao lado para ouvir trechos da entrevista de Zé Renato.

Outra veterana dessas trupes, a cantora Cida Moreira elogia o clima de camaradagem entre os músicos, que conviviam num ambiente livre de disputas de ego  e ataques de estrelismo. “Nunca teve esse papo de alguém achar que era a atração principal e que os outros eram novatos com importância menor. Uma coisa que se perdeu na convivência artística. Inclusive porque os encontros de palco hoje são frutos de arranjos de gravadoras e produtores, em vez de serem consequência da vontade de artistas tocarem juntos ou de iniciativas como o próprio Pixinguinha”, considera. Antes de aparecer nas programações de 2005 e 2007, o nome de Cida Moreira esteve entre as atrações do projeto em 1985 e 1986 − ao lado do compositor e regente Wagner Tiso, do goiano Marcelo Barra e da cantora Zélia Duncan, ainda nos primórdios de carreira. “Minha primeira apresentação no Norte do país foi pelo Projeto Pixinguinha, em 1986. Tinha gente que estranhava a minha presença, como se perguntasse assim: ‘Quem é essa mulher com cabelo vermelho e roupa esquisita?’. Mas daí eu começava a cantar e a plateia se calava para ouvir. E é engraçado porque isso acontece até hoje”, conta. Clique aqui para ouvir e ler outros trechos do depoimento de Cida Moreira ao Brasil Memória das Artes.

Em 2004, quando o projeto foi reeditado, a Funarte levou doze caravanas para 38 municípios. No ano seguinte, a andança dos artistas por palcos das capitais e do interior ficou ainda mais intensa: vinte grupos se apresentaram em 53 cidades. Aguardado com expectativa por plateias de Norte a Sul, a série de shows itinerante registrou em 2005 mais de 86 mil espectadores − muito mais do que os 57 mil contabilizados no ano da retomada. Mas engana-se quem pensa que não houve acidentes ao longo da sua sinuosa trajetória. Apesar do sucesso traduzido pelos números, a maratona dos músicos empacou em momentos que ameaçaram a continuidade da programação. Um deles ocorreu seis meses depois do relançamento do Pixinguinha. Duas caravanas que percorreriam cidades como Belo Horizonte, Vitória e Fortaleza, em julho de 2005, foram canceladas porque o dinheiro do Ministério da Cultura não havia sido depositado. O cronograma só foi retomado em agosto, graças a uma antecipação de verbas da Petrobras, maior patrocinadora do projeto, combinado a um plano drástico de redução de despesas.

Mas o maior golpe veio em 2008, com a extinção das caravanas, um ano após o projeto completar três décadas de surgimento. Em vez do formato original, que juntava sempre artistas consagrados e iniciantes, a Funarte anunciou que contemplaria dois artistas por estado − com noventa mil reais cada − para a produção de um CD e a realização de três shows em municípios dos seus estados de origem. Apresentadas como inovações pela entidade, as mudanças provocaram polêmica na classe artística, desagradando inclusive o produtor Hermínio Bello de Carvalho − que escreveu o “obituário” do projeto, publicado pelo jornal O Globo, em setembro daquele ano. Compositores como Ivan Lins e Jards Macalé também se posicionaram na época. O parceiro de Victor Martins defendeu que as caravanas eram uma maneira de atingir os centros menos favorecidos economicamente e pela distância. Já Macalé declarou que o nome do projeto deveria ser trocado, porque as alterações de formato fugiam da ideia original de circulação nacional. A última caravana partiu de São Luís do Maranhão em 16 de fevereiro de 2008, com o jovem e talentoso pianista André Mehmari e o experiente Ivan Lins.

Novamente interrompido, o Projeto Pixinguinha ainda ocupa um lugar na memória dos músicos e do público. E um lugar privilegiado − diga-se de passagem. “A filosofia do projeto faz falta hoje, acho que ele deveria virar lei e ser tombado como patrimônio cultural do país”, destaca o cantor Zé Renato. Pedro Paulo Malta acredita que o breque nas caravanas é um desserviço à cultura no país. “De um lado temos músicos querendo trabalhar e escoar o seu trabalho, que muitas vezes não são absorvidos pela mídia tradicional. Do outro há o público morto de sede, querendo conhecer. A importância do projeto tem que ficar acima das rusgas partidárias”, defende. Clique ao lado para ouvir trechos da entrevista de Pedro Paulo Malta.

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