A música como veículo de transformação social
“O Projeto Pixinguinha está mudando o Brasil”. A assertiva do jornalista Sérgio Cabral publicada em sua coluna no jornal O Globo, em 1978, resumia o sentimento da classe artística e dos intelectuais sobre o Pixinguinha. Em um momento no qual as emissoras de rádio eram dominadas pela música estrangeira, os espetáculos com artistas de qualidade a preços populares incentivavam a população de baixa renda a ir ao teatro e conhecer a MPB. “A formação de plateias, feita por meio de subsídio, não para o empresariado, mas com foco no espectador comum, é talvez a grande lição que o projeto ofereceu a todos aqueles que, à sua semelhança, buscaram fixar a identidade musical brasileira. “O Pixinguinha tinha como meta socializar o bem cultural, promovendo sua circulação e, como na célebre canção, “levar o artista aonde o povo está”, escreveu Hermínio Bello de Carvalho, em setembro de 1987, no editorial do jornal Pixinguinha – 10 Anos com a MPB, da Divisão de Música Popular da Funarte.
Para manter cheias as plateias, o projeto sempre levava um artista consagrado ao lado de um novo talento. “Apostamos na inteligência da plateia, oferecendo um cardápio variado, e não aquele jargão imposto pelo mercado”, diz Hermínio. A receita deu certo e chegou a incluir artistas de formação erudita, como Maria Lúcia Godoy. Também havia espaço para um espetáculo fora do padrão como o protagonizado por Sérgio Cabral, João Nogueira, Grupo Bandola e Mauricio Tapajós. Vestido de garçom, Sérgio Cabral falava sobre música e comentava o show.
O sucesso do projeto era tanto que, em muitas cidades, as trupes faziam dois shows por dia, todos com lotação esgotada. “O povo brasileiro era carente de boa música. Por isso, quando o Projeto Pixinguinha chegava na cidade, todo mundo ia assistir”, conta Dona Ivone Lara. “Muita gente que foi aos teatros nunca tinha assistido a um show na vida. As filas eram quilométricas”, lembra Nana Caymmi. Em 1980, a trupe formada por Joyce, Sivuca e Manduka foi obrigada a cancelar um show em Teresina por excesso de público.
Para a jornalista Maria Helena Dutra (1938-2008), que fez parte do júri de seleção de artistas, o Pixinguinha foi a mais importante iniciativa já feita pelo governo em prol da música popular brasileira. “É didático, no sentido mais rico do termo, esse trabalho pioneiro de trazer para cá os artistas de outras praças e de levar grandes nomes da MPB, conhecidos no eixo Rio – São Paulo até as pequenas cidades atendidas pelo Pixinguinha. Não há cultura sem informação. E o Projeto Pixinguinha põe ordem na casa, valoriza aquele que cria e crê no que faz. Forma e informa. Faz cultura”, opinou a estudiosa da cultura brasileira.